sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O cinturão de mangue

O economista e analista de sistemas Sérgio de Mattos Fonseca fechou sua bem sucedida empresa de informática para estudar oceanografia, dar aulas de educação ambiental e organizar mutirões de plantio no mangue

Por Liana John
Foto de Liana John



O ano era 1992 e o Brasil se preparava para receber representantes de 172 países na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio92. Economista e analista de sistemas de informação, Sérgio de Mattos Fonseca vivia entre computadores e escritórios, no Rio de Janeiro.

O agito em torno dos temas ambientais e o espaço aberto na mídia para termos antes pouco usados - biodiversidade, ecossistemas, mudanças climáticas - acendeu uma luzinha verde na vida do empresário. Ele puxou o freio de mão na Laptops Informática e Tecnologia; fechou a empresa no auge e deu uma guinada de 180 graus: atravessou a ponte Rio-Niterói para morar em Itaipu e criou a Associação de Proteção a Ecossistemas Costeiros (APREC). Dois anos mais tarde, a ONG foi formalizada com sede em Paquetá, no endereço da pizzaria que virou ganha-pão do economista por algum tempo.

"Ao ver toda aquela discussão em torno da Rio 92 decidi: isso é o que eu quero fazer", resume. E como não queria embarcar nos temas ambientais de orelhada, voltou aos bancos de escola, mais precisamente aos bancos da faculdade de Oceanografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Veja também a galeria de fotos da restauração do mangue

"Os jovens veteranos me receberam muito bem e foram logo avisando: não vamos dar trote no senhor, não". Mas Sérgio fez questão de passar pelo ritual de iniciação como todo mundo e assim conquistou vários amigos de outras gerações.

"De início, o trabalho da APREC era muito técnico. Criamos o Cultimar, que, aliás, continua até hoje como um projeto de criação de moluscos e peixes para alimentação humana, mas com base científica, estudos, avaliações", conta. A ideia de plantar mangue surgiu da necessidade de fazer frente à especulação imobiliária e à degradação no entorno da laguna de Itaipu, em Niterói.

Uma das batalhas se deu contra os donos de uma boate localizada perto da laguna, do outro lado da rua. Eles precisavam de um estacionamento para seus clientes e não acharam "nada demais" cortar a vegetação, fazer um pequeno aterro e delimitar as vagas ali mesmo, na faixa de maré antes ocupada pelo mangue. Através da APREC, Sérgio entrou com uma ação no Ministério Público e conseguiu desfazer o malfeito.

A faixa de mangue plantada em frente à boate já fechou e não dá passagem nem para carros nem para pedestres. A circulação só é livre para caranguejos, garças, mergulhões, peixinhos e camarões. Ainda tem uma ou outra casa quebrando a integridade da paisagem, mas o cinturão verde cresce e se torna mais denso a cada ano que passa.

Outra batalha foi ao longo do molhe construído com pedras bem no meio do que era para ser mangue. Sérgio e seus ajudantes em mutirão não conseguiram remover as pedras, mas plantaram mais de 22 mil mudas de mangue, de modo a permitir que a vegetação fechasse rapidamente, restaurando o ecossistema na linha de maré.

As mudas foram plantadas dos dois lados do molhe, mas coletores de caranguejos nada preocupados com a sustentabilidade arrancaram tudo do lado voltado para a baía. "Com o tempo, o próprio mangue vai se encarregando de repovoar o que foi arrancado, lançando uma muda aqui, outra ali", comemora Sérgio. "É como no resto da laguna: fizemos o plantio em alguns pontos, mas o manguezal cresceu e fechou tudo ao redor".

"As mudas vieram de outros mangues da região, foram aclimatadas na minha casa e plantadas de acordo com a tolerância à salinidade", acrescenta. O acompanhamento do crescimento das árvores e a avaliação do valor daquele mangue restaurado se transformaram na dissertação de mestrado de Sérgio de Mattos Fonseca, em Ciência Ambiental, na Universidade Federal Fluminense (UFF), com o título: "O valor de existência de um ecossistema costeiro tropical, através da disposição ao trabalho voluntário".

Fonte: http://viajeaqui.abril.com.br/national-geographic/especiais/florestas/cinturao-mangue-639597.shtml?page=0

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